Canta um
passarinho numa manhã de domingo e destaca-se sob o zumbido latente
da cidade que entra constantemente pela janela. Será que ele é
feliz cantando ali tão solitário em meio aos prédios e ruídos?
Talvez não conheça outra coisa, então como pensar se é feliz ou
não? Ele apenas é. Seu canto é o que conhece, seu destino
inevitável, mas será que lá no fundo existe algo que lhe diz que
existem outros mundos, outras possibilidades de ser?
O pássaro
não consegue evitar seu canto ou seu voo, expressões da sua
essência, embora certamente sofra adaptações para viver aqui.
Nós, por algum motivo, com todo nosso potencial argumentativo,
científico e dedutivo ainda precisamos de um longo caminho para
expressar quem somos. A espontaneidade e leveza de criança vão sendo
moldadas em inúmeras máscaras, camadas de ajuste social, filtros de
educação e defesa. Então caminhamos pelo mundo manifestando muito
pouco da nossa natureza mais íntima, com pequenas exceções para
momentos em que nossa vulnerabilidade fica à mostra e,
paradoxalmente, temos a oportunidade de expressar nossa força e
beleza. Para muitos, são momentos mínimos, pequenos lampejos de
possibilidade de ser que logo voltam a ser apagados. Ao longo do
tempo fui reparando que o tempo de duração destes lampejos são
inversamente proporcionais à nossa fragilidade: quanto mais nossa
expressão espontânea no mundo se realiza, mais fortes somos. Fortes
em um senso de unidade, de entendimento de si e do próximo. E quanto
menos podemos expor a nossa essência - por mais ferozes, temidos e
prontos ao ataque que possamos parecer - mais frágil está nossa
capacidade de ser quem somos.
Este
mundo não foi moldado para nossa expressão, mas para nos ajustarmos
à expressão do que já está aí. E se quisermos outra coisa, o
mundo avisa: vai ser dolorido, vai ser duro e perigoso. É isso mesmo
que você quer? E por vezes dizemos que não, mas ajustar-se também
tem seu preço, e esse preço muitas vezes nos torna ásperos, duros,
secos. A raiva por não ser quem somos transparece nos gestos, nas
palavras pontiagudas, nos olhares. É preciso muita resiliência para
recuperar um coração que foi obrigado a entrar em uma forma muito
menor do que a sua, e que viveu ali encaixotado, dobrado de maneiras
inimagináveis, sufocado ao mínimo movimento.
Em maior ou menor grau o mundo nos empurra a ser quem não somos. E, pelas leis da física, quanto maior uma força, mais forte será a força contrária. Desde que
a gente chegue perto o suficiente, podemos ver que todos que
encontramos pelo caminho estão em busca de empatia e significado, só que muitas vezes a única maneira brusca e absurda de tentar
encontrar isso foi apontando todas as armas ao mesmo tempo a qualquer
um que tentasse se aproximar. Acredito que reconhecer nossa própria
beleza e fragilidade e a do outro é nossa tarefa mais importante e
mais difícil nesta vida. Tentar enxergar além da casca rígida que nos envolve
e nos agarrarmos aos pequenos lampejos, fontes de luz, vulnerabilidade e
beleza, a essência do ser humano.
Que você tenha uma semana com muito espaço para ser você!
Olá, Rosa Paula,
ResponderExcluirEste texto provoca reflexões! rsrs. Acho que o ajustamento à cultura é inevitável, já que é muito difícil fugirmos àquilo que nos foi inculcado na infância. O que quero dizer é que passaremos aos nossos filhos os valores que nos foram passados. Mas a sabedoria nos diz que a gente tem de estimular sim a expressão da essência daqueles que nos cercam. A gente tem de permitir que as pessoas sejam quem são e façam aquilo que amam, pois isso contribui para a felicidade humana e a diversidade enriquece a vida.
Quanto aos animais, penso como Dostoiévski, eles são felizes, vivem uma alegria simples e perceptível.
Um beijo e boa semana
Rosa,
ResponderExcluirAdorei o seu post, é bem assim mesmo. As vezes temos que nos moldar, tentar nos adequar a vida. Mas sempre espero que eu fique com a mesma essencia do que eu sou. Não ficar presa ao pessimismo.
Beijos
Adriana
Eu não sei se é porque você vive no exterior como eu, mas eu sinto tanto isso, especialmente nos últimos tempos aqui dessa fria Alemanha em que me tornei um pouco fria por defesa, é meio que uma máscara porque sei quem sou e que sou assim para que as coisas funcionem aqui, mas é algo "necessário".
ResponderExcluirApesar disso, eu não vejo esse seu pensamento do lado negativo, porque a gente aprende pra caramba assim. E passa a se entregar de inteiro pra quem sabe que é de verdade, pra quem toca o coração de verdade.
Essa adaptação (até a um novo meio) é muito difícil, mas amadurecemos muito.
Eu ainda sou grata. O seu texto é tão generalizado e profundo que quem lê se identifica de alguma forma. :)
Beijos!
Ótimo texto e reflexão,
ResponderExcluirBjs e boa semana!
Rosa, querida!
ResponderExcluirLindo texto!
Sim, estamos sempre a nos moldar. E se vivemos no estrangeiro o processo é ainda mais intenso. Somos quase duplos... Carregamos conosco a cultura que nos foi colocada no berço e nos integramos num espaço que antes nada tinha a ver conosco. E sim, nem sempre é fácil.
Abraço!
Feliz terça para você!
adorei este texto em tão poucas palavras tem uma mensagem tão marcante,, gostei imenso do seu blog e convido-a a conhecer o meu e partilhar a sua opinião,
ResponderExcluirbeijinhos
http://belezademulhermae.blogspot,pt
adorei este texto em tão poucas palavras tem uma mensagem tão marcante,, gostei imenso do seu blog e convido-a a conhecer o meu e partilhar a sua opinião,
ResponderExcluirbeijinhos
http://belezademulhermae.blogspot,pt
"Em maior ou menor grau o mundo nos empurra a ser quem não somos", pra mim essa frase é o ponto mais forte de seu texto, nesse mundo caótico e frágil, tenho pensado muito em como tenho mudado meus pensamentos e emoções em função dessa força externa, e isso me assusta, quero me manter leal a mim mesma, e isso não tem sido fácil.
ResponderExcluirLer seu texto me fez pensar nisso e reinforçou a vontade de estar mais perto de minha própria essência, pois sei que quando nos aproximamos de nossa essência nos tornamos mais alegres, mais inteiros, mais sábios.
Um abraço apertado e um lindo dia pra você.
"Em maior ou menor grau o mundo nos empurra a ser quem não somos", pra mim essa frase é o ponto mais forte de seu texto, nesse mundo caótico e frágil, tenho pensado muito em como tenho mudado meus pensamentos e emoções em função dessa força externa, e isso me assusta, quero me manter leal a mim mesma, e isso não tem sido fácil.
ResponderExcluirLer seu texto me fez pensar nisso e reinforçou a vontade de estar mais perto de minha própria essência, pois sei que quando nos aproximamos de nossa essência nos tornamos mais alegres, mais inteiros, mais sábios.
Um abraço apertado e um lindo dia pra você.
Lindas fotos e ótimo texto para se refletir.
ResponderExcluirBjs e ótima semana!
Lindo texto.. bem reflexivo e verdadeiro.
ResponderExcluirPor favor, se puder responde essa minha pesquisa que estou fazendo lá no log para conhecer mais ainda meus seguidores. http://www.dmulheres.com.br/2015/09/pesquisa.html
Se você por acaso já respondeu desconsidera meu pedido.
Bjokas, Sheyla.
http://www.dmulheres.com.br/
Fiquei uns 4 minutos decifrando a primeira imagem! Belas palavras!
ResponderExcluirAhhh Rosa, às vezes, o cansaço bate...dá um vontade de fugir do mundo porque sempre temos que nos adaptar a algo, às pessoas em volta...e quando a gente repara que ninguém em volta cede um milímitro. Por vezes, penso em devolver na mesma moeda, porém, sendo quem sou, sou agraciada com a sensação de dever cumprido, mas por vezes me protejo, me escondo, ignoro...até a coragem aparecer de novo! rs Bjs
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