04 dezembro 2015

Pare e respire #15 - As sufragistas

Há alguns dias assisti ao filme As Sufragistas, que estreará no Brasil no dia 24 de dezembro. Ele conta um pouquinho da história da luta pelo direito ao voto feminino no Reino Unido. Levei minha filha de 12 anos para assistir ao filme que se passa em 1918 e sua primeira reação foi ficar surpresa como há tão pouco tempo nossos direitos na esfera civil eram praticamente nulos (isto porque ela ainda nem tinha visto ao final do filme que a Suíça, por exemplo, só instituiu o voto feminino em 1971(!) e a Arábia Saudita prometeu este ano que em breve as mulheres terão direito ao voto (!!!!). Sem o voto, tínhamos legislações feitas apenas por homens para homens. Ou seja, não tínhamos direito a abrir um negócio; não podíamos nos tornar juízas, deputadas ou exercer qualquer outro cargo público; não tínhamos nem mesmo direito à guarda dos filhos! A luta pelo voto era uma luta por todo esse longo caminho. E o filme mostra parte do movimento que tomou atitudes radicais em busca deste objetivo.



Observando as condições a que as mulheres estavam sujeitas não é difícil compreender porque algumas fizeram esta opção. O que é realmente duro de compreender é porque hoje toda essa luta é desconsiderada pelas próprias mulheres. Eu tenho que confessar que quando escuto uma mulher dizer que não é feminista ou chamar outra de "feministazinha" ou, no termo mais em voga, "feminazi" meu coração dói um pouquinho. Dói porque eu sinto como uma ofensa a todas que foram presas, que apanharam, que marcharam, que levantaram as que estavam no chão, que estiveram em audiências, que perderam o direito de ver os seus filhos para que eu e você tivéssemos hoje a liberdade de escolha de sermos engenheira, bailarina, astronauta, costureira, piloto, dona de casa ou presidente da república. Dói porque esta é uma luta que ainda está acontecendo em muitas esferas e muitas mulheres nem se dão conta disso. Dói porque a nova forma de conter as mulheres e sua capacidade é objetificá-las e deixá-las obsessivamente preocupadas com seu corpo e imagem, já que o status quo entendeu que não adianta dizer para uma mulher que ela não pode fazer alguma coisa, desde que  ela acredite que pode. 

Logo depois assisti ao documentário Miss Representation (disponível no Netflix somente em inglês) que mostra que ainda há um longo caminho a percorrer. Mulheres em posição de destaque e liderança são diminuídas e ridicularizadas todos os dias, seja por sua aparência, seja colocando em dúvida sua capacidade, seja tratando-as com condescendência por serem "apenas" mulheres. E na mídia como forma de entretenimento a coisa vai ainda pior. Existe uma distorção tão grande  entre o que é uma mulher real em que garotas possam verdadeiramente se inspirar e as mulheres que ganham destaque na mídia que é difícil até mensurar. Enquanto nos EUA mulheres entre a adolescência e os 30 anos representam 17% da população, elas representam 78% dos personagens femininos na televisão. E claro que isso não é diferente por aqui. Estamos dizendo às nossas meninas todos os dias: não envelheça e não engorde pois isso é feio e você vai ser tornar invisível. E isto é apenas uma das muitas mensagens absurdas que estamos permitindo que sejam passadas às novas gerações. 

Há pouco tempo Essena O´Neill, uma menina de 18 anos com mais de 1 milhão de seguidores no Instagram e ídolo de milhões de adolescentes que sonhavam com o seu tipo de vida, tornou-se assunto da mídia mundial quando decidiu abandonar as redes sociais, não sem antes falar a verdade por trás de cada foto, da sua "espontaneidade" totalmente programada, da tonelada de maquiagem para esconder imperfeições, do dinheiro que vinha com cada "sugestão" de produto e da sua infelicidade pela falta de conexões reais. Ela relata que um momento crucial para a sua decisão foi ter encontrado uma menina de 12 anos na rua que pediu detalhes sobre como seguir a carreira de modelo e alcançar tudo que ela (Essena) conquistou. Ali ela percebeu que sua imagem completamente editada era inspiração e aspiração de meninas que deveriam estar sonhando em ser muito mais que um rosto e um corpo bonito.

Todas essas histórias me tocam profundamente não apenas por eu ser mulher e parte desse sistema, tanto usufruindo dos benefícios conquistados pelas que vieram antes de mim como de alguma maneira ajudando a consolidá-los (além de involuntariamente ajudar a perpetuar algumas desigualdades), mas por ter uma filha de 12 anos cheia de sonhos e vida, naquele momento mágico em que começamos a descobrir o mundo por nós mesmas com todas as implicações que isso traz. Daqui do meu pequeno cantinho contribuo para disseminar essas ideias para que ela encontre um mundo que a respeite por quem ela é. 



9 comentários:

  1. Já vi que o filme tem grandes atores.
    Deve ser bom.
    Quando vier para o Netflix ou para o Telecine Play, vou querer assistir.

    Não sou feminista, Rosa Paula.
    Acho que meus direitos deve ser iguais aos de todos.
    Não tem porque haver separação.
    Por que uma lei para homem que agride mulher, se tem mulher que agride homem?
    Por que cotas para negros? Por que não posso me aceitar negra?
    Virou uma bagunça.
    Qualquer dia vou querer instituir um dia da loura(loira).
    Ou dia da consciência loura.

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    1. Rosa,

      Vou responder aqui no pé do comentário da Liliane porque me identifiquei com o que ela expôs.

      Também não sou feminista. As sufragistas, essas sim, realmente realizaram conquistas admiráveis e abriram caminho para nossas vidas serem como são.

      Porém atualmente vejo muitos exageros no comportamento feminista, com muitas idéias equivocadas e até radicais. Eu me sinto tão respeitada, valorizada e segura... Não temos mais os grandes problemas do passado, certo?

      Às vezes tenho a impressão que algumas mulheres tentam terceirizar para outros a responsabilidade para as coisas mais absurdas. Já ouvi até que fulana "alisou o cabelo por pressão da sociedade". Será mesmo? Ou era ela que achava o cabelo liso mais bonito? Será que tudo é culpa dos outros?

      Isso me incomoda, porque algumas mulheres têm essa tendência de sempre se colocarem no papel de vítima de alguém, como se não tivessem responsabilidade nem na escolha do penteado.

      Acho que chegamos a um ponto razoável. Não dá pra ignorar que homens e mulheres têm suas diferenças, suas aptidões, os pontos fortes e fracos, e que cada um deveria fazer o que tem de melhor, sem recalques.

      Não vejo nenhuma feminista reclamando dos privilégios de ser mulher (de seguro do carro mais barato à não obrigação de servir o exército). Ué, não era pra ser tudo igual? E agora?

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  2. Oi Rosa!
    Ainda não assisti a esse filme mas vou procurar assim que possível. Muito interessante a história.
    Engraçado, não conhecia Essena e já quero ir lá pesquisar sobre ela. Por isso que opto pelo meu "anonimato" na blogosfera. Não almejo nada além do que compartilhar e aprender. Gosto como está.

    :**

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  3. Olá, querida Rosa Paula,

    Amei este post, porque os nossos pontos de vista são comuns! Eu não nego nunca o meu feminismo e ainda digo que o mundo (até o momento) tem sido um lugar de muitas injustiças.
    Olhando as relações entre os sexos no passado e também as que ainda subsistem em algumas sociedades patriarcais, a gente percebe muito claramente o jogo de poder que era e é mantido bem encoberto nesse jogo. A palavra que o qualificaria seria simplesmente 'canalhice', pois os donos do poder impedem que a parte subjugada se torne apta para "jogar" em igualdade de condições com eles. Fazem isso impossibilitando que a pessoa receba educação e criando leis e costumes arbitrários e absurdos, que mantêm a parte dominada sob rédeas curtas, enquanto que eles mesmo gozam de liberdade irrestrita.
    As mulheres que se levantaram e se levantam contra isso foram e são valentes e heroicas. Eu ainda não vi este filme. Mas já havia o incluído em minha lista de "a ver", boa indicação! rsrs.

    Um beijo e ótimo fim de semana

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  4. Ah, sim, não sabia da estória da Essena O'neill, mas já virei fã dela, por causa deste post, rsrs.

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  5. Que interessante a história da Essena. Fui pesquisar porque não a conhecia.
    Perfeição não existe mas parece que querem nos convencer que sim: todo mundo, nas redes sociais se diverte prá caramba, tem mil compromissos, mil festas... Realmente não é um mundo real; talvez seja o que aquela pessoa idealiza.
    Bjs

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  6. Oi Rosa,
    Quero muito assistir, mas talvez ele não venha para o Brasil, li qqer coisa na Revista Veja a respeito da não vinda do filme, espero que eu esteja errada.
    Bjs

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  7. Ai, que tema difícil quando há mulheres que supostamente não entendem a causa real do feminismo ou não entendem como ele conquista e liberta.
    Lembro de uma declaração difícil de aceitar que a própria Meryl Streep fez ao divulgar esse filme na Inglaterra, dizendo ser humanista e não feminista.
    Ela deve ser muito esclarecida e ter se preparado muito pra esse filme, e entendo que saiba muito sobre esse tema, mas defender o humanismo ao invés do feminismo ficou parecendo um discurso de quem não sabia o que estava dizendo.

    Preferi ignorar e continuar apreciando a obra dela, inclusive essa, que é ainda, pra nossa tristeza um tema tão atual.
    Chocada que a Suíça só liberou voto feminino em 1971!
    Essa eu não imaginava!

    O feminismo ficou cansativo para os olhos de quem ainda não aceita ou vê a igualdade e liberdade que ele traz às mulheres. E talvez por isso seja tão mal visto, também por isso, além do machismo enraizado nas pessoas e nas próprias mulheres por culpa de toda uma cultura.

    E que seja cansativo, porém presente mesmo, porque foi assim que quebrei preconceitos e me vi machista. Hoje penso e ajo diferente, antes de toda essa revolução de reeducação, de um novo repensar mudou meu raciocínio sobre isso. Me sinto mais livre, quanto ao meu corpo, minhas escolhas, tenho senso crítico da mídia...

    Enfim, o feminismo é libertador.
    Quero conferir esse filme.

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  8. Não acho que quando alguma mulher diz que não é feminista o diz no sentido que falas. Acho que a maior parte das pessoas associa o feminismo a um extremo e não à igualdade - à supremacia das mulheres como já foi (e em parte é) a dos homens. Não acho que seja por mal ou a descurar esforços e sacrifícios passados do género...
    A questão da imagem já é outra bem diferente, mas acaba por estar tudo relacionado enquanto consequência da evolução da história e da sociedade... A questão dos distúrbios alimentares, das preocupações excessivas com a imagem, é realmente triste e desesperante. Talvez fosse inevitável com o crescimento de certas indústrias, mas que dói dói.
    Gostei do post, tens uma opinião muito válida... Tenho de ver o filme e o documentário!

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